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Mil mães que choram

Por Cecília Oliveira, Diretora Executiva do Instituto Fogo Cruzado

Em 19/09/2022 às 08:29:52


Todos os dias, em alguma favela do Rio de Janeiro, milhares de moradores acordam no susto, despertados pelo som dos tiros e dos helicópteros. Depois, ligam nos programas de TV da manhã para acompanhar notícias sobre as operações policiais, sabendo que suas casas podem estar no raio do tiroteio e que a possibilidade de encontrar corpos pelas ruas, mesmo tão cedo, é grande.

O Fogo Cruzado começou em 2016 na Região Metropolitana do Rio, e desde então também acordamos bem cedo para monitorar essas ações e operações. Nosso objetivo, quando notificamos um tiroteio aos nossos usuários pelo aplicativo, é fazer com que as pessoas consigam chegar no fim do dia sem se deparar com balas pelo caminho.

Tem sido uma jornada de muito suor e de alguns momentos tristes. O que estamos vivendo este mês é um deles. Somamos todas as operações policiais da Região Metropolitana do Rio que terminaram com três ou mais mortos nos últimos seis anos, nossa série histórica, e descobrimos que já houve 1.008 mortos. Soa absurdo, mas é isso mesmo: desde 2016, as chacinas policiais - quando há três ou mais mortes - somam mais de 1 mil mortos.

Os últimos quatro anos foram fundamentais para que a gente chegasse tão rápido à marca de 1 mil. Vivemos um desastre na segurança pública do Rio. Matar virou modus operandi. Desde 2019, a cada quatro chacinas, três são decorrentes de ações e operações policiais.

Em 2021, uma operação no Jacarezinho terminou com 28 mortos - 27 civis e um policial civil. Foi a operação policial mais letal da história do Rio. No mesmo ano, houve oito mortos em uma operação no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo. Já neste ano, na Vila Cruzeiro, houve nove mortos em fevereiro e outros 23 em maio. Em julho, no Complexo do Alemão, mais 16 civis foram mortos em um dia - uma moradora morreu no dia seguinte. A lista é imensa.
Tão grave quanto um episódio de alta letalidade policial é a naturalização dele. Preso recentemente por suspeita de ligação com os maiores bicheiros da cidade, o delegado Allan Turnowski, então secretário de Polícia Civil na operação do Jacarezinho, havia deixado o cargo para ser candidato a deputado federal. Usava como número de candidato o 27, quantidade de mortos no Jacarezinho. O deboche do delegado preso, cujo lema de campanha é "tolerância zero", é aviltante.

"Independentemente de quem morreu, o sofrimento de uma família precisa ser respeitado. Se parte da população apoia isso, a gente espera que, no mínimo, os governantes tenham respeito. Isso não aconteceu, pelo contrário, eles comemoraram. Ter vivido tanta coisa pesada em um dia só é algo que vou carregar para a vida toda", lamenta o irmão de uma das vítimas da operação no Jacarezinho, que prefere não se identificar por medo.

Do morador que não consegue sair para trabalhar até a mãe que leva o filho para a escola, o modelo de operação policial que vigora na segurança pública do Rio precisa ser revisto urgentemente, se quem governar o estado pretende torná-lo um lugar melhor para viver. Os órgãos de controle também têm responsabilidades: só no caso do Jacarezinho, 10 de 13 investigações do Ministério Público do Rio foram arquivadas.

Nova Brasília, Fallet, Jacarezinho, Vila Cruzeiro, Alemão. Até quando vamos viver uma roleta russa de chacinas policiais? A contagem precisa parar agora.

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